segunda-feira, 22 de março de 2010

Fio
- Claude Bloc -
Sempre pensei que borboletas
fossem como as palavras
que saíam da minha boca,
e que só elas, num momento
poderiam apaziguar minha vida,
meus anseios...

Hoje sei que minhas palavras
ainda revoam pela estratosfera
e com um fio transparente
escrevem minha história
enquanto ainda não se esgotaram todos os caminhos
enquanto ainda não feneceram todos os amores
mesmo quando descubro que nada foi em vão
... e que esse fio
me amarrou definitivamente à vida
e a todos os meus sonhos.
.
Foto e texto por Claude Bloc
Retalhos
- Claude Bloc -
Há dias em que não resisto. Olho para trás e vejo nas coisas, uma história tecida em retalhos. Se há sentido no que vejo não importa, são apenas restos de mil pedacinhos de tecido que passaram a viver juntos montando um enredo interminável.

Hoje choveu. Não sei se foi por isso ou por estar sem nada prá fazer que me pus a brincar com o tempo um bocadinho, tentando preparar essa colcha de retalhos. Seria como se me preparasse para o encontro de mais um pedaço nesse todo.

Não nego, amofinava-me por receio de não ter nada de importante para acrescentar, na hora em que eu olhasse para trás com o intuito de tentar finalmente fazer um balanço de contas que ainda não fiz, por não saber como.

Esbarrei no tempo e nas lembranças. Diante de mim uma confecção absolutamente complexa. Olhei para trás e tentei entender que teia era essa que me envolvia, e o que dizia ela de mim e para mim. Em que espaço de minha colcha estariam meus amigos, como me arrumaria para receber todos os sonhos que se acovardavam no momento de encontrar pessoas importantes para mim? Como poderia recebê-las nessa tessitura que reúnia todos os retalhos de minha vida?

Detive-me em alguns momentos. Com agulha e linha emendei alguns sorrisos aos meus e consegui estender a colcha por sobre um tempo indefinido. Enquanto isso, me alimentei de sonhos. Adormeci meus pensamentos. E sem dar-me conta, me debrucei sobre um diálogo com a memória. Lá os encontrei: todos a quem eu prezo. Todos a quem amo de uma forma ou de outra.

Por isso digo a todos vocês indistintamente: foi sempre assim. E hoje ainda persisto neste caminho, sem me dar por ele, até que olho para trás e penso nele. E não penso bem nem mal dessas passagens. Aceito que assim sejam. Sem rumo certo. Apenas com certo rumo. Como esses retalhos cheios de sentido. Cada retalho envolvendo um momento. Uma teia tecida à mão. A minha mão. Elo entre as partes. Único elemento comum na interseção dos dias e das diversas partes, pois não sei ser diferente.
E se me perguntam se procuro terra firme, respondo:
Não! Procuro um sonho que me assente.
Claude Bloc

sexta-feira, 19 de março de 2010

Do mesmo jeito
- Claude Bloc -


Meu poema se prende ao tempo
Em articulações que se engatam,
Se encadeiam
Em dimensões que se perdem
Se entremeiam
Por isso quero
Recuperar as noites
Mal dormidas
Noites em claro
Sem brilho nem beleza.
Quero ignorar teu choro
E teu desleixo
Meu eterno cansaço
De só cuidar de mim...

Meu poema explode
E arrebata
E se dilui nas sombras
E se prende aos laços
Nessas suturas de minha emoção

Meu poema começa e acaba
Do mesmo jeito
Fechando o círculo
Abrindo outro
Numa infindável espiral.
.
Foto e texto por Claude Bloc

sexta-feira, 12 de março de 2010

No ar
- Claude Bloc -


Estou no ar.
Se ando ou se paro
Caminho entre nuvens...


Muitas vezes
mergulho em céus claros

e encontro num sol incandescente
sorrisos de ontem
retalhos de hoje,
de meu íntimo desejo
de aquecer-me
ou de (re)encontra-me.

Outras vezes
escorrego em dias cinzentos

e me recolho.
Encurto o passo
e nessas horas tenho medo
vai que eu me perca?


Claude Bloc
Entre alhos e bugalhos
- Claude Bloc -
Vou assim
entre alhos e bugalhos.

Encontro-te
em tantos dos meus sentimentos
que me perco
na velocidade dos meus sonhos.

Eu, eu apenas
querendo simplesmente
ser o sopro ou o estro
o ar que te faz navegar pelo tempo.

Nesse espaço,
sou um corpo feito de brisas.

Olhar-te, eu o faço
em todos os momentos
com olhos de vento
... e quero
nos dias iluminados

trazer-te para perto
e ser absolutamente
a tua parte
e minha contraparte.


Claude Bloc

quarta-feira, 3 de março de 2010

Pé de Baraúna
- Claude Bloc -

O que restava do pé de baraúna até uns 4 anos atrás

.Quando crianças, acreditamos em tudo. Nos põem medo do que não existe, criam enredos que passam pela tangente da imaginação, rebocam as paredes da nossa criatividade, sem direito a pesar ou medir o resultado do desenlace e a autenticidade dessas fantasiosas empreitadas.

.Pois foi lá em Serra Verde que me apareceu uma dessas histórias meio escabrosas a qual, na verdade, nunca quis experienciar, nem fazer o teste de S. Tomé.

Era o seguinte: todo final de tarde a turminha de irmãos, primos e amigos que passavam as férias na casa-sede com a gente, depois de um bom banho no açude, seguia em bando para passear a pé pela fazenda. Havia algumas opções para os passeios: dirigir-se à Represa (do açude) onde morava a família Carlos, João Paulo e “Sulidade”, Maria de Geraldo, João Soares e João Franco com suas devidas famílias. Ir até o engenho no mês de julho, ou simplesmente ir à bodega de Seu Moreira, pra comprar algum bombom. Ir até o Jardim, sítio dos Botelhos e Aurélios (Orelo), que ficava perto do engenho ou pros lados do Guedes, aonde depois vieram morar Mãe Cândida (Cãida) e Mãe Naninha, duas irmãs, boleiras de mão cheia. Havia também a opção de subir a ladeira da Serra, em direção à casa de Seu Manoel Dantas. Cada tarde havia, portanto, uma opção diferente para se escolher.

Nesses passeios, em cada terreiro uma saudação aos donos da casa, um gracejo, ou se ia “escruvitiar” pelo chão de terra em busca de pedrinhas coloridas ou, quem sabe, subir nos pés de cajarana em busca dos frutos de vez... Eram portanto, mil estripulias, sem contar com o drible às vacas que ruminavam pela estrada, ou pelos terreiros das casas...

Quando se ia à Represa, o passeio era mais aprazível. Seguia-se pela orla do açude, sentindo o hálito da tarde refrescando-se aos poucos até amofinar-se na boca da noite. Na hora em que os primeiros sinais da noite apareciam e os sapos e a jias começavam sua serenata inteiriça, a gente, “foi-não foi”, voltava naquela algazarra, trotando em cavalos de pau tirados da própria mata, cantando e apelidando uns e outros, mesmo que o freguês não gostasse... Atrás de nós, os rabiscos dos galhos pelo chão traçavam sonhos que mais tarde a gente buscava naquela terra como remédio para as nossas fragilidades hodiernas.

Já quase chegando em casa, subíamos a última ladeira que embeiçava o açude e fatalmente passávamos por um velho pé de baraúna, altivo e sinistro. Seu tronco ocado estava sempre quase abarrotado de pedras atiradas pelos passantes. Aquele vão no tronco da árvore parecia nunca se satisfazer, pois nunca estava completamente cheio. Naquele nosso tropel, sempre conduzimos alguma pedra na mão para ali depositarmos o que, para nós, significava uma passagem sem sustos para o que nos restava de caminho até chegarmos em casa. Assim, acreditávamos estar alimentando a árvore e dessa forma não correríamos o risco de ver a assombração que aparecia no pé de baraúna a partir do cair de uma noite fechada.

Pois é, seu João Franco e Seu Joaquim Carlos juravam ter visto sair dali, no meio da escuridão, um cachorro preto de olhos de fogo... E o bicho só parava de segui-los quando chegavam no terreiro da casa-sede. Daí......... você se arriscaria a passar lá de noite sozinho/a? Quem disse? (Eu também não!)

O que se soube foi que um dia o cachorro dos olhos de fogo “deu uma carreira” em Seu João Franco e o mordeu (não sei aonde)... E conta a lenda que toda noite de lua cheia seu João Franco virava lobisomem.

Acredita nisso? Não?

Texto e foto digitalizada por Claude Bloc