terça-feira, 14 de abril de 2009

Chuva

........ A chuva de hoje proporcionou-me um curioso diálogo com o tempo. Lembrei-me da Rua Irineu Pinheiro nos muitos invernos que atravessei no Crato. Manhãs caudalosas. A rua inundada de uma ponta a outra, até as calçadas, causando transtorno aos incautos estudantes matutinos. Nem as famigeradas galochas eram suficientes para conter a “fúria” das águas que desciam levando as pedras rua abaixo. Nem os sapatos “colegiais” impediam a alegria dos meninos que saiam em revoada de suas casas para a escola. Risos, risadas, gente encharcada, lama, choro... e muitas vezes o retorno de um ou outro, vítima da “guerra fria” da água barrenta...
........ Difícil esquecer também os dias infindáveis de brincadeiras pelas ruas, onde, depois da chuva, filetes de água, refletindo o céu nublado, acompanhavam o meio-fio, dobrando na esquina, em busca do Rio das Piabas...
........ A chuva apascentava os ânimos. As brincadeiras eram infinitamente alegres e provocavam a criatividade. Diques e açudes assoreavam as ruas e invadiam a passagem dos carros. Eu era mera personagem dessa história de chuvas? Descia pela rua pisoteando a água, remexendo os sonhos de algum príncipe escondido n’algum “castelo”. Menino que simplesmente me assistia passivamente passeando pela chuva, chacoalhando a água com os pés, espargindo sonhos por aí...
........ Foi assim, nesse diálogo com a chuva que comecei a escrever. Tentava nas palavras encontrar o cheiro da terra e os sons das águas lavando e levando as pedras do calçamento. A verdade era para mim como essa chuva. Procurava me encontrar em meio a esse rio de palavras todas que escorriam pela rua desfarelando os sonhos pela enxurrada. A chuva naquele tempo era também a expressão dissimulada do meu pensamento. Eu, mera criança, apreendia o mundo como se eu fora extraterrestre. Tinha dificuldade de escrever. As águas lavavam-me as idéias. Meus textos eram híbridos e insípidos...
........ Hoje, porém, a chuva e eu podemos andar de mãos dadas...

Por Claude Bloc

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